Como se chama churrasco grego na Grécia? Ou pastel de Belém em Belém? Ou molho inglês na Inglaterra? Quem nunca fez essa piadinha? Quem nunca?
Pois é, na Turquia tem o banho turco, e a resposta para a inevitável pergunta não é apenas “banho”. Aquilo é um ritual, um processo de várias etapas, do qual tomei parte meio por acaso.
Eu estava em Éfeso, na parte asiática do país. Nessa cidade está a casa onde a Virgem Maria teria vivido e também as ruínas do templo de Ártemis. Comprei o passeio numa agência de viagens em Istambul, de onde parti às 21h30 de um sábado. Onze horas depois, às oito e meia da manhã, cheguei a Éfeso.
Não dormi durante a viagem, porque não consigo dormir em ônibus ou avião ou qualquer outro lugar que não seja uma cama, a não ser que a situação esteja bem crítica. Além disso, passei o dia andando sob um sol absurdamente quente. Às cinco e meia da tarde, eu estava de volta à agência de viagens em Éfeso, morto de cansado e tendo tomado o último banho 20 horas atrás. E meu ônibus de volta para Istambul seria apenas dali a quatro horas.
Eu definitivamente precisava de um banho. Foi então que o agente me sugeriu ir a um banho turco. Ele me deu até um cartão da agência que me daria desconto lá no estabelecimento, mas é claro que não consegui, porque barganhar na Turquia é uma tarefa para poucos, e eu não sou um deles.
Cheguei ao local, entreguei o cartão da agência e disse “Eu quero um banho”. É muito estranho. Então o senhor da recepção me deu duas toalhas (mas não como as que conhecemos, elas são na verdade lençóis mais espessos que o normal) e indicou que eu entrasse em uma pequena sala, onde eu deixaria minhas roupas. Saí da salinha com os tamancos de madeira que lá estavam e o senhor da recepção apontou para uma porta, por onde eu deveria entrar.
Ao passar pela porta, tive uma vertigem de tão quente que estava o recinto. No centro do lugar, havia um hexágono ou octógono ou outra forma geométrica em mármore sob o teto abobadado. Nas laterais do recinto, havia vários chuveiros. A instrução foi “tome banho e deite no mármore”. Foi o que fiz. E ao deitar no mármore entendi a expressão mármore do inferno. Que calor! (Já tinha um cara lá cozinhando. Perguntei de onde ele era, e ele disse “New York”. Por que americanos não dizem que são americanos? Sempre dizem a cidade ou o estado?)
Em determinado momento, entra um senhor gordo, de bigode, enrolado em uma toalha, calçando tamancos e diz “Next!”. O americano foi. Eu estava deitado no mármore olhando para cima, então não vi nada. Minutos depois, “Next!”. E então eu fui. Ao lado da porta de entrada, havia uma “cama” de mármore, mas não estava aquecida. Deitei na tal cama de mármore e o senhor de bigode simplesmente me deu um banho. Fico pensando no diálogo de apresentação quando esse cara conhece uma pessoa nova:
– Tudo bem?
– Tudo bem.
– E então, faz o que da vida?
– Eu dou banho em caras.
Primeiro ele vestiu umas luvas que pareciam pantufas, mas no lugar onde seria a sola é na verdade uma lixa. E posso garantir que ele não estava preocupado em ser delicado. Aquele processo limpou até meus pecados de tão convicto que o senhor de bigode estava ao realizar seu trabalho. Depois rolou um enxague e então passamos para a próxima etapa: ensaboar.
O “banhador de caras” encheu uma espécie de fronha com sabão e passou em mim, da cabeça – sim, serviu de xampu também – aos pés. Depois disso, novo enxague. Entre uma etapa e outra, ele só dizia “Lay down” e “Sit up”. Nada além disso.
A orientação seguinte foi tomar outro banho e deitar novamente no mármore. Fiquei lá cozinhando por uns 10 minutos e ao sair da sauna, os 30 graus de Éfeso ganharam o status de clima ameno. No hall, o bigodudo me recebeu com uma pergunta: “Oil massage?”. Pensei “Tá no inferno? Abraça o capeta!”. E ele deu a massagem com a mesma delicadeza que deu o banho.
Tudo isso custou 60 liras turcas (mais ou menos uns R$ 68), 45 do banho mais 15 da massagem. O desconto virou história, mas muito por causa da minha total falta de habilidade em barganhar. Saí de lá, posso dizer, de alma lavada e pronto pra enfrentar mais 11 horas de ônibus de volta a Istambul.
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