A vida está caminhando. Com a gravidez da Alinne quase entrando no último trimestre, estou na reta final para ser pai. E, com a novidade, tenho experimentado situações e pensamentos que nunca me haviam ocorrido.
Quem está ou já esteve no meu lugar sabe que o momento é de preparação para o pequeno que irá chegar: rotina de exames, leituras dos diversos manuais de instruções para quem irá manusear um bebê pela primeira vez, montagem do quarto e providência do tal enxoval. É a respeito desses dois últimos itens que o mundo tem me levado a pensar bastante.
Temos feito nossas pesquisas de itens para decorar e para vestir tanto na internet quanto em lojas físicas. Seja qual for o ambiente, noventa por cento dos produtos à venda se repartem na dicotomia azul-rosa. Nenhuma novidade. Isso todo mundo sabe e, felizmente, tem se discutido bastante sobre alternativas a essas duas caixas, com a emergência das chamadas “cores neutras”: amarelo, verde, marrom, cinza – enfim, descobriram que há outras cores na natureza e que não necessariamente o mundo que cerca um recém-nascido precisa ser monocromático como a capa de um disco do Belle And Sebastian. Bom pra gente, que desde sempre acha essa monocromia um saco e tem comprado coisas de todos os matizes – incluindo rosa e azul.
Infelizmente, o que ainda não se tem discutido direito são as temáticas dos produtos. Isso me ocorreu quando a gente estava em uma loja de departamentos, e, um tanto a contragosto, a Alinne pegou um minitênis rosa e me falou:
– Queria outra cor, mas, quando é pra menino, a galera rotula mesmo.
– Como assim?
– Esse sapatinho aqui. O de menina é só rosa. O verde, ~de menino~, tem uma estampa gigante escrito “California surf”.
De fato, o tênis verde, da mesma marca do outro, era categorizado como de menino no código de barras da loja, mas a cor não era a única diferença. Havia a tal estampa – irada e retrô, por sinal – direcionada aos potenciais surfistas do futuro. No rosa não havia nada.
Passei a observar com mais atenção os outros produtos da mesma loja e, desde então, de todas as outras, não mais avaliando apenas a falta de inspiração nas cores, mas também o conteúdo das estampas. Nos lençóis, camisetas e pijamas desenvolvidos para os meninos, o mundo é incrível e sem limites: foguetes, robôs, super-heróis, discos voadores, alienígenas, dinossauros! Já às meninas é reservado o próprio tédio, estampado na forma de princesas, bonecas, camponesas recatadas. Caiu-me então a ficha de que não é a cor, mas o mundo imaginário colorido por esses tons o grande problema.
Eu vou ser muito orgulhoso do que a Penélope decidir ser quando crescer, seja o que for. De antemão, sei que princesa ela não vai ser, pois aqui em casa não tem nenhum rei e estamos sem previsão de algum golpe de estado que nos transforme em monarcas. Mas será que criada cercada só por ilustrações de moçoilas indefesas, que passam a vida na janela esperando ser resgatadas por um destemido príncipe, vai lhe ocorrer que ela pode ser engenheira aeroespacial, paleontóloga ou surfista sem culpa, sem achar que está ocupando um lugar que não é dela?
Não vou arriscar.
- Gravidez: não é a cor, é o tema - 14 de março de 2016
Logo de saída a Penélope já deu muita sorte de ter um pai que pense assim.
Eu não tive essa sorte (apesar de ter um pai incrível), e acredito que a grande maioria das mulheres da minha geração não tiveram. E ainda assim nós nos tornamos essas essas mulheres maravilhosas.
Imagine a geração da Penélope!
Jade, vai ser uma geração tão incrível que eu mal posso esperar! Igor tá dizendo aqui: “Vai problematizar desde cedo!”. haha! Meu pai também é incrível, mas, ainda assim, antigo. Mas sempre que posso vou dando minhas lições de modernidade e independência. Na adolescência foi bem conflituoso, mas hoje rola um respeito incrível! <3