Desde o “ser ou não ser” de Hamlet, na obra de William Shakespeare, essa é uma das questões que mais inquietam a humanidade: biscoito ou bolacha?
Em 2015, a youtuber Jout Jout, do canal Jout Jout Prazer, aquela do batom vermelho, levantou essa questão em um vídeo que teve mais de duas milhões de visualizações com um funk com alto poder de impregnação mental. Na tentativa de acabar com a polêmica, ela defende o uso do termo biscoito, valendo-se das descrições das embalagens.
Na mesma época, em resposta ao funk da youtuber, o astuto marketing da Oreo publicou em sua página tentando pegar um jacaré nessa onda.
Pode chamar de biscoito, pode chamar de bolacha.
Sendo um pacote de Oreo, tudo se encaixa.
Não é mesmo, Jout Jout Prazer?
Contudo o vídeo da marca não obteve mais de 30 mil visualizações, contrariando as expectativas.
Eis que se passam dois anos, e na coluna da semana passada sobre algumas confusões em relação a alimentos que têm nomes diferentes dependendo do lugar ou o prato que leva o mesmo nome e que são completamente diferentes, o fantasma ressurge nos comentários e fica o questionamento:
Modolo, É Biscoito ou é Bolacha?
Gastronomicamente falando os dois termos estão corretos, contudo há suas particularidades, regionalismos, e a resposta está na origem das palavras.
O biscoito vem do termo “biscuit”, do latim bis (repetição) e cuit (cozimento), que faz referência ao processo de origem, quando a massa era primeiro assada e posteriormente tornava ao forno para desidratar e ficar crocante.
Os biscoitos surgiram dessa forma: produziam-se grandes porções de massa assadas (também conhecida como bolo) e, para evitar bolores, deterioração e conservar o alimento por mais tempo, os bolos eram fatiados e levados ao forno para que desidratassem, tornando-se crocantes, dando origem aos biscoitos (forneado duas vezes).
Égua, isso no Ceará chama torrada (fatia) de bolo!
Com o tempo, as receitas ganharam requinte, especiarias, chocolate e baunilha com a descoberta das Américas, e o processo passou a ser com o fim especifico, deixou de ter dois tempos em forno, e assar e desidratar passaram a ser numa fornada só.
As bolachas vêm derivando desse processo direto em forno, pois a palavra se origina do latim bulla (bolo) com o sufixo -acha que significa diminuído. Ou seja, para que possamos desidratar massas em forno diretamente em um único processo, precisamos usar pequenas porções de massa (bolos pequenos), que geralmente se achatam e se arredondam ao assar, dando origem às bolachas.
De acordo com essa lógica da gênese das palavras, o processo industrial, hoje, confecciona bolachas e não necessariamente biscoitos, como descrito no rótulo.
Contudo há uma outra linha que defende que:
Biscoito não tem recheio e Bolacha tem!
Segundo essa linha, bolachas são dois ou mais biscoitos ligados por um recheio de cremes, doces ou geleias. Desta forma, toda bolacha é biscoito, mas nem todo biscoito é bolacha.
O que você acha?!
Desta forma, biscoitos seriam apenas os amanteigados, biscoitos de polvilho, tarecos, madeleines, dentre outros.
Culturalmente, se percorrermos o Brasil em estados como São Paulo, os estados do sul e o Amapá, predomina o uso generalizado do termo bolacha. Enquanto estados como Pernambuco, Rio de Janeiro, Bahia e Ceará utilizam o termo biscoito de forma geral. Em Minas Gerais há ainda uma divisão regional, sendo o termo bolacha mais usado no Triângulo, e o termo biscoito nas demais regiões do estado.
De acordo com a legislação vigente RESOLUÇÃO – RDC Nº 263, DE 22 DE SETEMBRO DE 2005:
De forma mais abrangente, a nova resolução vem revogando a Resolução – CNNPA nº 12, de 1978, que regulamentava a produção e classificava de acordo com os ingredientes.
Segundo o texto da antiga resolução:
Os biscoitos ou bolachas são classificados de acordo com o ingrediente que o caracteriza ou forma de apresentação:
a) biscoitos ou bolachas salgadas – produtos que contêm cloreto de sódio em quantidade que acentue o sabor salgado, além das substâncias normais desses produtos;
b) biscoitos ou bolachas doces – produtos que contêm açúcar, além das substâncias normais nesse tipo de produtos;
c) recheados – quando possuírem um recheio apropriado;
d) revestidos – quando possuírem um revestimento apropriado;
e) “grissini” – produto preparado com farinha de trigo, manteiga ou gordura, água e sal e apresentados sob a forma de cilindros finos e curtos.
f) biscoitos ou bolachas para aperitivos e petiscos ou salgadinhos – produtos que contêm condimentos, substâncias alimentícias normais desses tipos de produtos; apresentam-se geralmente sob formas variadas e tamanhos bem pequenos. Ex.: “Petisco de queijo”, “Bolacha de cebola para aperitivo”.
g) palitos para aperitivos ou “pretsel” – produto preparado com farinha, água, sal, manteiga ou gordura e fermento-biológico; a massa é moldada em forma de varetas, que podem ser dobradas em forma de oito, e são submetidas a prévio cozimento rápido em banho alcalino, antes de assadas.
h) “waffle” – produto preparado à base de farinha de trigo, amido, fermento químico, manteiga ou gordura, leite e ovos e apresentado sob a forma de folha prensadas;
i) “waffle” recheado – produto preparado à base de farinhas, amidos ou féculas, doce ou salgado, podendo conter leite, ovos, manteiga, gorduras e outras substancias alimentícias que o caracteriza, como coco, frutas oleaginosas. geléias de frutas e queijo. Tais produtos podem ser decorados com doces, glacês, geléias, frutas secas ou cristalizadas, queijo, anchova, etc.
Dizia, dizia e não dizia muita coisa!
Por isso, a nova resolução colocou tudo num pacote só. E, no fim das contas, sou obrigado a concordar com o marketing da Mondelez, fabricante da Oreo, biscoito ou bolacha “ambos os dois” são bons!
Beijos e até o nosso próximo encontro com a gastronomia temperada com algumas especiarias.
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