O que você já deixou de fazer só por ser mulher?
A Constituição diz que todos são iguais perante a lei, mas a gente sabe que, na prática, os homens acabam tendo mais oportunidades, sendo vistos como mais capazes e são criados com liberdades às quais nunca tivemos acesso, como, por exemplo, a liberdade de vestir sempre jeans e camiseta, enquanto a gente (acha que) precisa sempre de roupas novas, bolsas, brincos, maquiagem, arrumar cabelo e tantos outros quetais somente pra colocar o pé fora de casa.
Neste #8M, a gente quer conversar com quem ainda tem preconceito com o feminismo e com as feministas. A gente jura que é do bem, que luta para que mulheres e homens sejam iguais na nossa sociedade, e que a gente só precisa de uma chance pra desfazer todas as más impressões que surgem das mentiras que contam por aí a nosso respeito.
- Feministas odeiam homens
Nós não odiamos os homens, nós odiamos o machismo, e ele está presente tanto nos homens quanto nas mulheres. As feministas são livres para se apaixonar, namorar, casar e, se quiserem, também são livres pra aproveitar a solteirice como quiserem. A gente cresceu acreditando que o natural do homem é ser safado, e o natural da mulher é ser casta. Quanto sofrimento nossas avós e nossas mães passaram achando que era o papel delas ficar em casa com os filhos enquanto seus cônjuges curtiam a noite com outras mulheres – essas, tidas como menos merecedoras de amor e de respeito, xingadas por serem “a outra”.
A gente cresceu achando que o homem é assim mesmo, e a mulher é que deve ser responsável/culpada: foi traída é porque não satisfez o cara em casa; engravidou porque quis; engordou e deixou de ser atraente. A culpa não é nunca só nossa, mas é isso que o patriarcado nos ensinou. Nós não precisamos mais ser coitadas, ficar sofrendo em relacionamento infeliz/abusivo/violento. Se a gente se unir, entender que o machismo é um problema que está na cabeça de todo mundo, a gente consegue desconstruir essas ideias que nos aprisionam e nos impedem de viver da maneira como queremos. E quando a gente se desconstrói, a gente ajuda as pessoas ao nosso redor a fazer o mesmo caminho.
2. Feministas não gostam de cavalheirismo
Errado, errado, mil vezes errado. Feministas querem, sim, independência, mas quem disse que isso tem a ver com romance? A gente aceita que o boy abra a porta do carro e que pague a conta do restaurante. O que a gente não aceita é o cara fazer isso e achar que, por causa disso, nós temos obrigação de corresponder às expectativas dele, como naquela história que viralizou ano passado, de um cara revoltado que pagou uma sobremesa de R$ 20 pra moça que conheceu no Tinder, e ela não quis transar com ele no final. O problema não é pagar a conta, pagar a conta pode, o que não pode é achar que está comprando sexo/amor com um cavalheirismo fake, cheio de intenções.
3. Feministas são feias e peludas
Nãoooo! As feministas são apenas mulheres, e nós, mulheres, somos todas diferentes. Somos de todos os tamanhos, formas, cores. Tem feminista solteira, tem feminista casada, tem feminista mãe, tem feminista lésbica, bi, trans. Tem até feminista que cansou de sentir dor todo mês e abandonou a depilação. Assim como tem feminista que continua se depilando, e tá tudo bem. Ninguém é menos ou mais feminista por ter menos ou mais pelos, por ter uma beleza mais padrão ou menos padrão. Todas as mulheres são atingidas pela pressão estética que a sociedade (patriarcal) impõe, até a Gisele Bündchen, e o que o feminismo quer é liberdade pra ser quem se é, assim como os homens têm liberdade pra serem feios, peludos, barrigudos e ainda serem considerados atraentes, interessantes e serem muito menos questionados sobre o peso ou as roupas que vestem, por exemplo.
4. Feministas não usam sutiã
Sabe a história de feministas queimando sutiã? Ela é quase uma lenda urbana. Em 1968, nos Estados Unidos, mulheres se reuniram pra protestar contra o patriarcado durante o concurso de Miss America. A ideia era, sim, ir ao teatro onde o concurso acontecia e fazer uma enorme fogueira não só com sutiãs, mas com todos os símbolos da opressão que elas sofriam no dia a dia (e a gente ainda sofre): lingerie, salto alto, batom… Elas não conseguiram autorização pra tacar fogo, mas fizeram uma grande pilha pra mostrar que, todo dia, as mulheres se submetem a pequenos sacrifícios, pequenas torturas pessoais pra se encaixar em um padrão que é inatingível pra grande maioria.
Mas, assim como falei aqui em cima, o feminismo quer as mulheres livres pra serem quem quiserem – com ou sem sutiã.
5. Feministas são abortistas
Não, porque nada é preto no branco. Antes de entrar no tema aborto, é preciso dizer que existem várias vertentes do feminismo, incluindo o feminismo cristão, que certamente é contra o aborto. O que a bell hooks, que é uma teórica feminista que escreve desde os anos 80, fala é que o feminismo busca, entre outras coisas, a liberdade reprodutiva da mulher. O início dessa liberdade reprodutiva foi com o surgimento do anticoncepcional, depois o da pílula do dia seguinte, mas que o aborto também está ligado à mulher ter liberdade sobre o seu próprio corpo, sua própria vida. Somos livres pra escolher quando engravidar, mas só até certo ponto.
Eu, que sou mãe de uma menina incrível, e talvez queira ter outro filho no futuro, sou a favor do aborto, principalmente depois de ver a barra real que é ser mãe. Eu, que sou casada, tenho uma vida estável, um relacionamento saudável e um marido que é um grande pai e companheiro, não faria um aborto. Mas não posso achar que essa é a realidade das outras mulheres, muito menos que outras pessoas devam controlar o destino delas. Vale lembrar também que a maior parte dos políticos que fazem e votam as leis são homens conservadores, ou seja, mais uma vez, homens decidindo a vida das mulheres. A gente não merece mais isso.
6. Feministas são promíscuas
Liberdade sexual. O homem que tem muitas parceiras é garanhão, a mulher que tem muitos parceiros é galinha. O homem que trai porque não se controla é macho, a mulher que trai é espancada pelo parceiro, às vezes morta, e é julgada, xingada por todo mundo. As feministas querem o direito de serem livres pra se relacionarem como, quando e com quem quiserem sem serem julgadas por isso. De ficarem solteiras e não serem vistas como encalhadas, de transar no primeiro encontro sem o cara ficar pensando que ela não é “pra casar”.
7. Feministas não são femininas
Não, mil vezes não! Do mesmo jeito que há homens que não gostam de esportes, há mulheres que não gostam de fazer compras. Claro que já houve, na história da teoria feminista, gente que defendia que a mulher que se maquia é fútil e menos inteligente, mas isso não é nem um pouco verdade. Eu mesma, quando ia cobrir evento de cinema, maneirava na maquiagem porque tinha medo de ser vista como menos inteligente.
Graças ao feminismo, eu entendi que esse era um tipo de machismo e que a minha aparência nada tem a ver com a minha capacidade. Feministas podem, sim, ser femininas e usar maquiagem. O que a gente precisa sempre é refletir sobre essa necessidade da busca pela perfeição, até que ponto fazemos isso porque queremos ou porque nos sentimos obrigadas, se essa relação com a maquiagem é saudável e divertida ou uma dependência. Falamos muito por aqui sobre beleza e o que pensamos sobre nos amarmos como somos.
8. Feministas odeiam mulheres que escolhem não trabalhar pra ficar com os filhos
Não! Eu mesma escolhi mudar de país com meu marido e minha filha, ele trabalha, e eu não. Escolhi, não é fácil, entro em crise todo mês, mas não sou menos feminista porque troquei o trabalho pela maternidade. O feminismo teve como uma de suas grandes bandeiras a carreira da mulher, a vida além dos filhos. Hoje a gente pode trabalhar fora, também pode não querer voltar a trabalhar ao final da licença maternidade, pode querer trabalhar como freelancer ou em home office ou empreendendo dentro de casa pra ficar mais perto das crianças. Ninguém tem o direito de julgar nossas escolhas, e certamente as feministas tentam não fazer isso.
9. Homens não podem ser feministas
Essa é mais uma polêmica. Há quem diga que os homens não podem se dizer feministas porque essa é uma luta das mulheres e deve ser feita e protagonizada pelas mulheres. Mas a Chimamanda Ngozi Adichie, no seu maravilhoso, curtíssimo e delicioso “Sejamos Todos Feministas”, fala que conhece poucas pessoas tão feministas quanto o seu irmão. bell hooks já ia na mesma linha: se as mulheres são vistas como menores na sociedade, e elas ganham o apoio do lado mais forte, fica mais fácil vencer. Afinal, o patriarcado não faz mal somente para as mulheres, faz mal a muitos homens também, que são criados para esconder os sentimentos (“Homem não chora!”), serem “machos”, e qualquer coisa fora dessa caixinha do troglodita tá errada. Isso, aliás, é chamado masculinidade tóxica, e é horrível.
Precisamos, no entanto, ficar atentas aos famosos “feministos”, que são os caras que pagam de desconstruídos, mas, na vida, se comportam exatamente como os machos mais opressores do mundo.
10. Feministas são esquerdistas
Claro que o último ponto é o mais polêmico! Existe feminismo de direita? É possível ser de direita e ser feminista? Dizem que sim. Apesar de todas quererem igualdade entre os gêneros, cada vertente meio que escolhe suas pautas principais. O feminismo interseccional, que levanta a bandeira da liberdade sexual e reprodutiva, que entende a luta de classes, que é contra o racismo, a homofobia, o capacitismo, o hetarismo, é essencialmente de esquerda. Mas há uma fatia feminista que tem como foco a igualdade salarial e de oportunidades no mercado de trabalho, pauta que se encaixa direitinho com pautas da direita. Então não, nem toda feminista é de esquerda, mas se você é de direita e quer ser feminista, tenta fazer um exercício e olhar pro lado, pra entender que melhor do que a igualdade é a equidade de oportunidades pra todas nós, independentemente da classe social e da cor da pele.
Afinal, por que nem todo mundo é feminista?
Essa é a pergunta de 1 milhão de dólares. O feminismo busca a igualdade entre os gêneros e a liberdade da mulher em todos os âmbitos. Mas será que a maior parte dos homens quer ter obrigações em casa, cuidar de filhos, tratar as mulheres com respeito e perder os privilégios no mercado de trabalho? A resposta é não! A grande verdade é que muitas mulheres também não queriam ter tantas obrigações, tanta carga mental, mas, mesmo assim, assumem o desafio porque não têm alternativa.
Hoje a gente precisa:
- parar de julgar as mulheres (o comportamento, a aparência, as escolhas, os relacionamentos)
- apoiar as mulheres, nunca concorrer (no trabalho, ouça a colega e pergunte a opinião dela; na vida, compre de pequenas empreendedoras, contrate serviços de mulheres)
- tentar desconstruir o pensamento machista de quem está ao nosso redor (nossos pais, parentes, amigos, companheiro)
- criar meninas e meninos com o máximo de igualdade possível (sim, a famosa ideologia de gênero, que na verdade não existe): meninas se tornam melhores em lógica e matemática se brincam de construir com blocos; meninos se tornam homens mais empáticos e responsáveis se brincam de casinha
- conversar sobre feminismo de forma simples e com dicas práticas com quem não tem muito acesso a informação (mulheres pobres e negras ainda são excluídas, mas são muitas e podem se beneficiar muito com noções básicas sobre empoderamento, relacionamento abusivo, mecanismos de controle de natalidade, direitos da mulher, saúde…)
- compartilhar informação nas redes sociais, espalhar a palavra, seguir feministas, ler feministas e beber de todas as fontes possíveis. Quem tem conhecimento tem tudo!
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