Mister Rogers, Daniel Tigre e Weezer: o mundo precisa de mais gentileza

0
5949

É oficial: estou obcecada por Mister Rogers. Eu não vi ainda o documentário, muito menos a cinebiografia com Tom Hanks, eu conheci o Mister Rogers mesmo foi pelo clipe do Weezer de “High as a Kite”.

Na produção, a banda faz uma paródia do programa Mister Rogers’ Neighborhood – sim, eles adoram fazer isso, começaram em “Buddy Holly”, parodiando o seriado Happy Days, dos anos 70 –, programa infantil que ficou uns 30 anos no ar.

No clipe, Mister Rivers’ Neighborhood começa exatamente como o original: uma maquete de cidade, zoom numa casinha e Rivers Cuomo na sala vestindo um cardigan vermelho e trocando os sapatos da rua pelos de casa.

No piloto de Mister Rogers’ Neighborhood, Fred Rogers faz isso pela primeira vez e pergunta pro minitelespectador se ele também troca de roupa quando chega em casa, como se estivesse se aprontando pra brincar o dia todo. Que coisa querida!

Tá, mas e o Daniel Tigre? Clica nesse vídeo aqui em cima e vem comigo que eu te conto. Reconheceu esse tema? SIM, É O DO DANIEL TIGRE!

Não é coincidência. Daniel canta a mesma música, veste o suéter vermelho e os tênis de casa. Daniel mora na vizinhança de Make-Believe, a mesma do Mister Rogers (e, olha só, o nome do quinto álbum do Weezer, com os hits Beverly Hills, Perfect Situation, This is Such a Pity…).

Daniel é o fantoche de tigre que Mister Rogers usava no programa. Comecei a ler a Wikipédia e vi que Rogers cuidava de todos os detalhes do programa, do roteiro às músicas (ele era formado em música) e que colaborou durante décadas com uma psicóloga chamada Margareth – que no desenho é a irmã do Daniel Tigre.

Todo o universo de Rogers foi transportado pra a animação anos depois de sua morte: o Príncipe Quarta-Feira é filho do Rei Friday e da Rainha Sara Saturday, fantoches; Katerina é filha de Henrietta Pussycat, também fantoche; O, a coruja, é sobrinha de X, fantoche de coruja e por aí vai.

O Daniel original!

E por que trazer pros dias de hoje, em formato de desenho animado, o universo de um programa tão antigo e tão simples, de baixo orçamento até, comandado por um senhorzinho? Eu vi só um episódio (até agora) de Mister Rogers’ Neighborhood e posso responder: porque vale a pena.

O mundo de hoje precisa de Mister Rogers muito mais do que precisava em 1968, quando o programa estreou. “We could all use a little kindness” é o lema de Rogers e não poderia ser mais atual: todos nós, adultos e crianças, precisamos de um pouco mais de gentileza.

Gentileza e uma voz que não grita, não alardeia, não agride. Uma voz serena que conversa com a gente e nos ensina a ser melhores. No YouTube tem vários episódios completos, apenas em inglês, infelizmente, mas vale a pena pra quem souber e quiser conhecer.

Esse se chama “Feeling good about who we are” (Sentindo-se bem sobre quem somos), olha que especial. Ele começa mostrando um bambolê. Fala rapidinho de onde veio o nome em inglês, hula-hoop, e vai pro jardim pra tentar rodá-lo na cintura, sem sucesso. Aí ele conta que, na vizinhança, tem um professor de bambolê que pode ensinar pra todo mundo.

Aí ele chama o bondinho (o Neighborhood Trolley, o bondinho do desenho do Daniel Tigre), a câmera mostra a maquete da vizinhança e fecha num prédio, onde fica o estúdio de dança. A cena seguinte é de Mister Rogers com o professor aprendendo ao vivo a bambolear, errando e acertando. Depois uma professora de linguagem de sinais ensina o sinal pra bambolê, e ele é repetido ao longo do programa.

O bonde passeia pelos personagens da vizinhança, entre atrizes e fantoches, e todos falam sobre dar o seu melhor pra aprender algo novo. O programa termina de volta à casa de Mister Rogers, e ele diz que, depois de tentar, conseguindo ou não, é muito bom ser quem você é. Que valioso ensinar amor próprio e empatia na TV!

Mister Rogers tinha um jeito diferente de conversar com as crianças (as que tinham a idade certa e as que moravam dentro dos adultos) sobre situaçoes do dia a dia que podem ser desafiadoras e lançou séries de livros sobre primeiras vezes – ir ao dentista, começar na escola –, família – ganhar um irmão, divórcio dos pais, morte –, que eu vejo que também amparam os episódios de Daniel Tigre, esse desenho que sempre achei legal pra minha filha assistir. Agora tá explicado.

E o clipe do Weezer? A música é pesada, né? Fala sobre usar drogas pra fugir da dureza da vida – sejam as drogas lícitas ou ilícitas. O programa parodiado tem uma plateia de crianças e pais, que bocejam até a metade da música, choram de depressão com a letra e, na ponte, quando guitarras meio épicas aparecem, e o clima pesa pra valer, elas choram é de medo mesmo, com as luzes do estúdio piscando e deixando a banda com uma cara realmente assustadora. No fim, eles quebram o estúdio inteiro. Nada gentil.

Pra quem quer saber mais sobre Mister Rogers e sua hood, o doc se chama Won’t You Be My Neighboor, e a fic, Um Lindo Dia na Vizinhança (A Beautiful Day in the Neighborhood).

Alinne Rodrigues